quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A ESMOLA DE DULCE ( Augusto dos Anjos)
Ao Alfredo A.
E todo o dia eu vou como um perdidoDe dor, por entre a dolorosa estrada,Pedir a Dulce, a minha bem amadaA esmola dum carinho apetecido.E ela fita-me, o olhar enlanguescido,E eu balbucio trêmula balada:- Senhora dai-me u'a esmola - e estertoradaA minha voz soluça num gemido.Morre-me a voz, e eu gemo o último harpejo, Estendendo à Dulce a mão, a fé perdida, E dos lábios de Dulce cai um beijo.Depois, como este beijo me consola!Bendita seja a Dulce! A minha vidaEstava unicamente nessa esmola.
A DANÇA DA PSIQUE ( Augusto dos Anjos)
A dança dos encéfalos acesosComeça. A carne é fogo. A alma arde. A espaçosAs cabeças, as mãos, os pés e os braçosTombam, cedendo à ação de ignotos pesos!E então que a vaga dos instintos presos- Mãe de esterilidades e cansaços -Atira os pensamentos mais devassosContra os ossos cranianos indefesosSubitamente a cerebral coréiaPára. O cosmos sintético da IdéiaSurge. Emoções extraordinárias sintoArranco do meu crânio as nebulosasE acho um feixe de forças prodigiosasSustentando dois monstros: a alma e o instinto!
Esqueça O Que Te Disseram Sobre O Amor
Os Paralamas do Sucesso ( Herbert Vianna)
Desculpas é que eu não vou pedirPelo que quero e o que não quero fazerOutro dia eu apareço Enquanto isso vamos nos entenderEsqueça o que te disseramSobre casa filhos e televisãoÉ preciso sangue frio pra ver Que o sangue é quente E que vai ser diferente
Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Vai ser diferenteAh! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Vai ser diferente
Pode ser o que você nunca viuPode ser o que você tem na mãoPode ser exatamente o que eu digoE também pode nãoEntão esqueça seus sonhosEsqueça as regras e a exceçãoÉ mais real cru e fascinante

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Não Sou Mais Disso
Zeca PagodinhoComposição: (zeca Pagodinho/jorge Aragão)
Eu não sei se ela fez feitiçoMacumba ou coisa assimEu só seiQue eu tô bem com elaA vida é melhor prá mim...
Eu deixei de ser pé-de-canaEu deixei de ser vagabundoAumentei minha fé em CristoSou bem-quistoPor todo mundo...(2x)
Na hora de trabalharLevanto sem reclamarAntes do galo cantarJá vou!À noite volto pro larPrá tomar banho e jantarSó tomo uma no barBastou!...
Provei prá vocêQue eu não sou mais dissoNão perco maisO meu compromissoNão perco maisUma noite à tôaNão traio e nem trocoA minha patroa...(2x)
Eu não sei se ela fez feitiçoFez macumba ou coisa assimEu só seiQue eu tô bem com elaE a vida é melhor prá mim...
Eu deixei de ser pé-de-canaEu deixei de ser vagabundoAumentei minha fé em CristoSou bem-quistoPor todo mundo...(2x)
Na hora de trabalharLevanto sem reclamarE antes do galo cantarJá vou!À noite volto pro larPrá tomar banho e jantarSó tomo uma no barBastou!...-Parei Geral!
Provei prá vocêQue eu não sou mais dissoNão perco maisO meu compromissoNão perco maisUma noite à tôaNão traio e nem trocoA minha patroa...(2x)
Eu não sei se ela fez feitiçoOu macumba ou coisa assimEu só seiQue eu tô bem com elaE a vida é melhor prá mim...
Eu deixei de ser pé-de-canaEu deixei de ser vagabundoAumentei minha fé em CristoSou bem-quistoPor todo mundo...(2x)
Aumentei minha fé em CristoSou bem-quistoPor todo mundo...
CONSOADA- Manuel Bandeira
Quando a Indesejada das gentes chegar(Não sei se dura ou caroável),Talvez eu tenha medo.Talvez sorria, ou diga:- Alô, iniludível!O meu dia foi bom, pode a noite descer.(A noite com seus sortilégios.)Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,A mesa posta,Com cada coisa em seu lugar.
Inútil
Ultraje a RigorComposição: Roger Moreira
(Vô cantar tudo de novo, ô ?!)
A gente não sabemosEscolher presidenteA gente não sabemosTomar conta da genteA gente não sabemosNem escovar os denteTem gringo pensandoQue nóis é indigente...
Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!
A gente faz carroE não sabe guiarA gente faz trilhoE não tem trem prá botarA gente faz filhoE não consegue criarA gente pede granaE não consegue pagar...
Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!
Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!
A gente faz músicaE não consegue gravarA gente escreve livroE não consegue publicarA gente escreve peçaE não consegue encenarA gente joga bolaE não consegue ganhar...
Inútil!A gente somos inútil!Inútil!A gente somos inútil!Inútil!Inútil!Inútil!Inú! Inú! Inú...

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Pedro Pedreiro (Italiano)
Chico BuarqueComposição: Chico Buarque - Calabrese - Jannacci
Pedro Pedreiro è pensosoEd aspetta il tramDomani forse dovrà Aspettare ancorPer il bene di chi Il bene di chi è senza un soldoPedro Pedreiro resta pensierosoE pensando il tempo passaE noi restiamo indietro a aspettarAspettando aspettando aspettandoAspettando il soleAspettando il tramAspettando sempre quel famoso aumentoChe non viene mai
Pedro Pedreiro è pensosoEd aspetta il tramDomani forse dovrà Aspettare ancorPer il bene di chi Il bene di chi è senza un soldoPedro Pedreiro aspetta l'allegriaE la fortunaCol biglietto della lotteria Ogni annoAspettando aspettando aspettandoAspettando il soleAspettando il tramAspettando sempre quel famoso aumentoAspettando il premio della lotteriaE la moglie di Pedro sta aspettando un figlioChe dovrà aspettare
Pedro Pedreiro è pensosoEd aspetta il tramDomani forse dovrà Aspettare ancorPer il bene di chi Il bene di chi è senza un soldoPedro Pedreiro aspetta anche l'amoreSta aspettando il giorno di arrivare in portoPedro non sa che forse forse in fondoAspetta qualche cosa al di là del suo mondoPiù grande del marMa perché sognar se poiCi si dispera di aspettare ancoraPedro Pedreiro vuol tornare indietroEd esser solo muratoreSenza aspettarAspettare aspettare aspettareAspettare il soleaspettare il tramAspettare ancora quel famoso aumentoAspettare un figlio che dovrà aspettareAspettare il premio della lotteriaAspettar la morteAspettare un portoAspettare di Non aspettare piùAspettare in fondoNiente altro cheLa speranza afflitta infinita sfinitaChe arrivi il suo tram
Pedro Pedreiro è pensoso ed aspettaPedro Pedreiro è pensoso ed aspettaPedro Pedreiro è pensoso ed aspetta il tramChe già vienChe già vienChe già vienChe già vien
Ob-La-Di, Ob-La-Da
The BeatlesComposição: John Lennon / Paul McCartney
Desmond has a barrow in the marketplaceMolly is the singer in a bandDesmond say to Molly, girl I like you faceAnd Molly says this as she takes him by the hand
Obladi, oblada,Life goes on, braLa la how the life goes onObladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes on
Desmond take a trolley to the jewelers storeBuys a twenty carat golden ring, (rin-ring)Takes it back to Molly waiting at the doorAnd as he gives it to her she begins to sing (sin-sing)
Obladi, obla-aLife goes on, braLa la how the life goes onObladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes on
Yeah, In a couple of years theyhave built a home sweet homeWith a couple of kids running in the yardof Desmond and Molly Jones
Happy ever after in the market placeDesmond lets the children lend a hand (arm... leg...!)Molly stays at home and does her pretty faceAnd in the evening she's a singer with the band
Obladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes onObladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes on
In a couple of years theyhave built a home sweet homeWith a couple of kids running in the yardof Desmond and Molly Jones
Happy ever after in the market placeMolly lets the children lend a handDesmond stays at home and does his pretty faceAnd in the evening she's a singer with the band
Obladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes onObladi, obladaLife goes on, braLa la how the life goes onAnd if you want some funtake Obladi blada

domingo, 27 de setembro de 2009

Saber Amar
Os Paralamas do SucessoComposição: Hebert Viana
A crueldade de que se é capazDeixar pra trás os corações partidosContra as armas do ciúme tão mortaisA submissão às vezes é um abrigo
Saber amarSaber deixar alguém te amar
Há quem não veja a onda onde ela estáE nada contra o rioTodas as formas de se controlar alguémSó trazem um amor vazio
Saber amarSaber deixar alguém te amar
O amor te escapa entre os dedosE o tempo escorre pelas mãosO sol já vai se pôr no mar
Saber amarSaber deixar alguém te amar
Há quem não veja a onda onde ela estáE nada contra o rioTodas as formas de se controlar alguémSó trazem um amor vazio
Saber amarÉ saber deixar alguém te amar
"Eu estou na lanterna dos afogados/Eu estou te esperando/Vê se não vai demorar." (Lanterna dos Afogados- Herbert Vianna)
Meu Erro
Os Paralamas do SucessoComposição: Herbert Vianna
Eu quis dizerVocê não quis escutarAgora não peçaNão me faça promessas...
Eu não quero te verNem quero acreditarQue vai ser diferenteQue tudo mudou...
Você diz não saberO que houve de erradoE o meu erro foi crerQue estar ao seu ladoBastaria!Ah! Meu Deus!Era tudo o que eu queriaEu dizia o seu nomeNão me abandone...
Mesmo querendoEu não vou me enganarEu conheço os seus passosEu vejo os seus errosNão há nada de novoAinda somos iguaisEntão não me chameNão olhe prá trás...
Você diz não saberO que houve de erradoE o meu erro foi crerQue estar ao seu ladoBastaria!Ah! Meu Deus!Era tudo o que eu queriaEu dizia o seu nomeNão me abandone jamais...
Mesmo querendoEu não vou me enganarEu conheço os seus passosEu vejo os seus errosNão há nada de novoAinda somos iguaisEntão não me chameNão olhe prá trás...
Você diz não saberO que houve de erradoE o meu erro foi crerQue estar ao seu ladoBastaria!Ah! Meu Deus!Era tudo o que eu queriaEu dizia o seu nomeNão me abandone jamais...
Não me abandone jamais... (3x)
Jorge Da Capadocia
Jorge Ben JorComposição: Jorge Ben Jor
Jorge sentou praça na cavalariaE eu estou feliz porque eu também sou da sua companhiaEu estou vestido com as roupas e as armas de JorgePara que meus inimigos tenham pés, não me alcancemPara que meus inimigos tenham mãos, não me peguem, não me toquemPara que meus inimigos tenham olhos e não me vejamE nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal
Armas de fogo, meu corpo não alcançaráFacas, lanças se quebrem, sem o meu corpo tocarCordas, correntes se arrebentem, sem o meu corpo amarrarPois eu estou vestido com as roupas e as armas de Jorge
Jorge é de Capadócia, viva Jorge!Jorge é de Capadócia, salve Jorge!
Perseverança, ganhou do sórdido fingimentoE disso tudo nasceu o amorPerseverança, ganhou do sórdido fingimentoE disso tudo nasceu o amor
Ogam toca pra OgumOgam toca pra OgumOgam, Ogam toca pra Ogum
Jorge é da CapadóciaJorge é da CapadóciaJorge é da CapadóciaJorge é da Capadócia
Ogam toca pra OgumOgam toca pra Ogum
Jorge sentou praça na cavalariaE eu estou feliz porque eu também sou da sua companhia
Ogam toca pra OgumOgam toca pra Ogum
ESTE É O PRÓLOGO ( Federico Garcia Lorca)
Deixaria neste livro toda a minha alma. este livro que viu as paisagens comigo e viveu horas santas.
Que pena dos livros que nos enchem as mãos de rosas e de estrelas e lentamente passam !
Que tristeza tão funda é olhar os retábulos de dores e de penas que um coração levanta !
Ver passar os espectros de vida que se apagam, ver o homem desnudo em Pégaso sem asas,
ver a vida e a morte, a síntese do mundo, que em espaços profundos se olham e se abraçam.
Um livro de poesias é o outono morto: os versos são as folhas negras em terras brancas,
e a voz que os lê é o sopro do vento que lhes incute nos peitos - entranháveis distâncias.
O poeta é uma árvore com frutos de tristeza e com folhas murchas de chorar o que ama.
O poeta é o médium da Natureza que explica sua grandeza por meio de palavras.
O poeta compreende todo o incompreensível e as coisas que se odeiam, ele, amigas as chamas.
Sabe que as veredas são todas impossíveis, e por isso de noite vai por elas com calma.
Nos livros de versos, entre rosas de sangue, vão passando as tristes e eternas caravanas
que fizeram ao poeta quando chora nas tardes, rodeado e cingido por seus próprios fantasmas.
Poesia é amargura, mel celeste que emana de um favo invisível que as almas fabricam.
Poesia é o impossível feito possível. Harpa que tem em vez de cordas corações e chamas.
Poesia é a vida que cruzamos com ânsia, esperando o que leva sem rumo a nossa barca.
Livros doces de versos sãos os astros que passam pelo silêncio mudo para o reino do Nada, escrevendo no céu suas estrofes de prata.
Oh ! que penas tão fundas e nunca remediadas, as vozes dolorosas que os poetas cantam !
Deixaria neste livro toda a minha alma...
( tradução: William Agel de Melo )

sábado, 26 de setembro de 2009

A foto da capaChico Buarque/1993

O retrato do artista quando moçoNão é promissora, cândida pinturaÉ a figura do larápio rastaqüeraNuma foto que não era para capaUma pose para câmera tão duraCujo foco toda lírica solapaEra rala a luz naquele calabouçoDo talento a clarabóia se tamparaE o poeta que ele sempre se souberaClaramente não mirava algum futuroVia o tira da sinistra que rosnaraE o fotógrafo frontal batendo a chapaÉ uma foto que não era para capaEra a mera contracara, a face obscuraO retrato da paúra quando o caraSe prepara para dar a cara a tapa
Bye, Bye, Brasil
Chico BuarqueComposição: Roberto Menescal e Chico Buarque
Oi, coraçãoNão dá pra falar muito nãoEspera passar o aviãoAssim que o inverno passarEu acho que vou te buscarAqui tá fazendo calorDeu pane no ventiladorJá tem fliperama em MacauTomei a costeira em Belém do ParáPuseram uma usina no marTalvez fique ruim pra pescarMeu amor
No TocantinsO chefe dos parintintinsVidrou na minha calça LeeEu vi uns patins pra vocêEu vi um Brasil na tevêCapaz de cair um toróEstou me sentindo tão sóOh, tenha dó de mimPintou uma chance legalUm lance lá na capitalNem tem que ter ginasialMeu amor
No TabarizO som é que nem os Bee GeesDancei com uma dona infelizQue tem um tufão nos quadrisTem um japonês trás de mimEu vou dar um pulo em ManausAqui tá quarenta e dois grausO sol nunca mais vai se pôrEu tenho saudades da nossa cançãoSaudades de roça e sertãoBom mesmo é ter um caminhãoMeu amor
Baby, bye byeAbraços na mãe e no paiEu acho que vou desligarAs fichas já vão terminarEu vou me mandar de trenóPra Rua do Sol, MaceióPeguei uma doença em IlhéusMas já tô quase bomEm março vou pro CearáCom a benção do meu orixáEu acho bauxita por láMeu amor
Bye bye, BrasilA última ficha caiuEu penso em vocês night and dayExplica que tá tudo okayEu só ando dentro da leiEu quero voltar, podes crerEu vi um Brasil na tevêPeguei uma doença em BelémAgora já tá tudo bemMas a ligação tá no fimTem um japonês trás de mimAquela aquarela mudouNa estrada peguei uma corCapaz de cair um toróEstou me sentindo um jilóEu tenho tesão é no marAssim que o inverno passarBateu uma saudade de tiTô a fim de encarar um siriCom a benção de Nosso SenhorO sol nunca mais vai se pôr
A Nível De
MPB4Composição: João Bosco
Vanderley e Odilonsão muito unidose vão pro Maracanãtodo domingocriticando o casamentoe o papo mostraque o casamento anda uma bosta...Yolanda e Adelinasão muito unidase se fazem companhiatodo domingoque os maridos vão pro jogo.Yolanda apostaque assim a nível de Propostao casamento anda uma bostae a Adelina não discorda.Estruturou-se um troca-trocae os quatro: hum-hum... oqué... tá bom... é...Só que Odilon, não pegando bem a coisa,agarrou o Vanderley e a Yolanda ó na Adelina.Vanderley e Odilonbem mais unidosempataram capitale estão montandorestaurante naturalcuja propostaé cada um come o que gosta.Yolanda e Adelinabem mais unidasacham viver um baratoe pra provartão fazendo artesanatoe pela amostraYolanda aposta na resposta.E Adelina não discordaque pinta e borda com o que gosta.É positiva essa propostade quatro: hum-hum... oquéi... tá bom... é...Só que Odilonensopapa o Vanderley com ciúmee Adelina dá na cara de Yoyô...Vanderley e OdilonYolanda e Adelinacada um faz o que gostae o relacionamento... continua a mesma bosta!
A rosa de Hiroxima ( Vinícius de Moraes)
Pensem nas criançasMudas telepáticasPensem nas meninasCegas inexatasPensem nas mulheresRotas alteradasPensem nas feridasComo rosas cálidasMas oh não se esqueçamDa rosa da rosaDa rosa de HiroximaA rosa hereditáriaA rosa radioativaEstúpida e inválidaA rosa com cirroseA anti-rosa atômicaSem cor sem perfumeSem rosa sem nada.
Federico Garcia Lorca
Jean FerratComposição: Paroles: C.H. Vic. Musique: Jean Ferrat 1968 "Jean Ferrat - Vol.1 (1999)"
Les guitares jouent des sérénadesQue j'entends sonner comme un tocsinMais jamais je n'atteindrai Grenade"Bien que j'en sache le chemin"Dans ta voixGalopaient des cavaliersEt les gitans étonnésLevaient leurs yeux de bronze et d'orSi ta voix se brisaVoilà plus de vingt ans qu'elle résonne encoreFederico GarcíaVoilà plus de vingt ans, CamaradesQue la nuit règne sur GrenadeIl n'y a plus de prince dans la villePour rêver tout hautDepuis le jour où la guardia civilT'a mis au cachotEt ton sang tiède en quête de l'auroreS'apprête déjàJ'entends monter par de longs corridorsLe bruit de leurs pasEt voici la porte grande ouverteOn t'entraîne par les rues désertéesAh! Laissez-moi le temps de connaîtreCe que ma mère m'a donnéMais déjàFace au mur blanc de la nuitTes yeux voient dans un éclairLes champs d'oliviers endormisEt ne se ferment pasDevant l'âcre lueur éclatant des fusilsFederico GarcíaLes lauriers ont pâli, CamaradesLe jour se lève sur GrenadeDure est la pierre et froide la campagneGarde les yeux closDe noirs taureaux font mugir la montagneGarde les yeux closEt vous Gitans, serrez bien vos compagnesAu creux des lits chaudsTon sang inonde la terre d'EspagneO FedericoLes guitares jouent des sérénadesDont les voix se brisent au matinNon, jamais je n'atteindrai Grenade"Bien que j'en sache le chemin"
A Mi Hermano Miguel
Mercedes SosaComposição: César Vallejo - Ángel Ritro
Hermano, hoy estoy en el poyo de la casa,¡donde nos haces una falta sin fondo!Me acuerdo que jugábamos esta hora, y que mamános acariciaba: "Pero, hijos ...".Ahora yo me escondo,como antes, todas estas oracionesvespertinas, y espero que tú no des conmigo.Por la sala, el zaguán, los corredores,después, te ocultas tú, y yo no doy contigo.Me acuerdo que nos hacíamos llorar,hermano, en aquel juego.Miguel, tú te escondisteuna noche de agosto, al alborear;pero, en vez de ocultarte riendo, estabas triste.Y tu gemelo corazón de esas tardesextintas se ha aburrido de no encontrarte. Y yacae sombra en el alma.Oye, hermano, no tardes en salir. Bueno... Puede inquietarse mamá.
Maddalena E' andata Via (Madalena foi pro mar)
Chico BuarqueComposição: Bardotti - Chico Buarque/1970
Maddalena è andata viaE sto con le mani in manoMaddalena è andata viaE sto con le mani in manoChi di voi l'incontreràLe ricordi che haDa tornare presto quaA curare i nostri figliDa tornare presto quaA curare i nostri figli
Deridendo gli occhi mieiOgni rondine staseraSembra quasi dire addioAll'addio di Maddalena
Maddalena è andata viaE sto con le mani in manoMaddalena è andata viaE sto con le mani in manoChi di voi l'incontreràLe ricordi che haDa tornare presto quaA curare i nostri figliDa tornare presto quaA curare i nostri figli
Io non devo pianger piùMaledir non val la penaGesù stesso perdonòPerdonò la Maddalena
Maddalena è andata viaE sto con le mani in mano
Irene
Caetano Veloso
Eu quero ir, minha gente, eu não sou daquiEu não tenho nada, quero ver Irene rirQuero ver Irene dar sua risadaQuero ver Irene dar sua risadaIrene ri, Irene ri, IreneIrene ri, Irene ri, IreneQuero ver Irene dar sua risada

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

A Cigarra
Renato TeixeiraComposição: Leon Gieco
Tantas vezes me mataramTanta vezes eu morriMas agora estou aquiRessuscitando
Agradeço ao meu destinoE a essa mão com um punhalPorque me matou tão malE eu segui cantando
Cantando ao solComo uma cigarraDepois de um ano embaixo da terraIgual a um sobreviventeRegressando da guerra
Tantas vezes me afastaramTantas reapareciE por tudo que vivivivi chorando
Mas depois de tanto prantoEu aos poucos percebiQue o meu sonho não tem donoE segui cantando
Cantando ao solComo uma cigarraDepois de um ano embaixo da terraIgual a um sobreviventeRegressando da guerra
Tantas vezes te mataramTantas ressuscitarásTantas noites passarásDesesperando
Mas na hora do naufrágioNa hora da escuridãoAlguém te resgataráPara ir cantando
Cantando ao solComo uma cigarraDepois de um ano embaixo da terraIgual a um sobreviventeRegressando da guerra
Açucena
Ivan LinsComposição: Ivan Lins/ Vitor Martins
Minha Açucena, te vejoA índia vinda das lendasIara saída dos riosCigana distante das tendas
Minha Açucena, te vejoPrincesa moura dos contosSereira achada nos baresA gueixa dos sonhos dos tontos
Coro:E quando sinto cheiro de jasmimTe vejo, AçucenaCuidando de mimPaina nas mãosE nos dedos do-inE quando sinto cheiro de jasmimTe vejo, AçucenaCuidando de mimPaina nas mãosE nos dedos do-in
Minha Açucena, te vejoPrincesa moura dos contosSereia achada nos baresA gueixa dos sonhos dos tontos
Nel Mezzo del Camin... ( Dante) - Olavo Bilac
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada E triste, e triste e fatigado eu vinha. Tinhas a alma de sonhos povoada, E a alma povoada de sonhos eu tinha... E paramos de súbito na estrada Da vida: longos anos, presa à minha A tua mão, a vista deslumbrada Tive da luz que teu olhar continha. Hoje segues de novo... Na partida Nem o pranto os teus olhos umedece, Nem te comove a dor da despedida. E eu, solitário, volto a face, e tremo, Vendo o teu vulto que desaparece Na extrema curva do caminho extremo. No Meio do Caminho
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada E triste, e triste e fatigado eu vinha. Tinhas a alma de sonhos povoada, E a alma povoada de sonhos eu tinha... E paramos de súbito na estrada Da vida: longos anos, presa à minha A tua mão, a vista deslumbrada Tive da luz que teu olhar continha. Hoje segues de novo... Na partida Nem o pranto os teus olhos umedece, Nem te comove a dor da despedida. E eu, solitário, volto a face, e tremo, Vendo o teu vulto que desaparece Na extrema curva do caminho extremo.
A Cidade Ideal
Chico BuarqueComposição: Enriquez/Bardotti/Chico Buarque
[introdução]Jumento: Àquela altura da estrada já éramos quatro amigos.Queríamos fazer um conjunto, bem.Queríamos ir juntos à cidade, muito bem.Só que, à medida que agente ía caminhando,quando começamos a falar dessa cidade, fui percebendoque os meus amigos tinham umas idéias bem esquisitassobre o que é uma cidade. Umas idéias atrapalhadas,cada ilusão. Negócio de louco...
[música]Cachorro:A cidade ideal dum cachorroTem um poste por metro quadradoNão tem carro, não corro, não morroE também nunca fico apertado
Galinha:A cidade ideal da galinhaTem as ruas cheias de minhocaA barriga fica tão quentinhaQue transforma o milho em pipoca
Crianças:Atenção porque nesta cidadeCorre-se a toda velocidadeE atenção que o negócio está pretoRestaurante assando galeto
Todos:Mas não, mas nãoO sonho é meu e eu sonho queDeve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresFossem somente crianças
Deve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresE os pintores e os vendedoresFossem somente crianças
Gata:A cidade ideal de uma gataÉ um prato de tripa fresquinhaTem sardinha num bonde de lataTem alcatra no final da linha
Jumento:Jumento é velho, velho e sabidoE por isso já está prevenidoA cidade é uma estranha senhoraQue hoje sorri e amanhã te devora
Crianças:Atenção que o jumento é sabidoÉ melhor ficar bem prevenidoE olha, gata, que a tua pelicaVai virar uma bela cuíca
Todos:Mas não, mas nãoO sonho é meu e eu sonho queDeve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresFossem somente crianças
Deve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresE os pintores e os vendedoresAs senhoras e os senhoresE os guardas e os inspetoresFossem somente crianças
Amo esta isla
(Pablo Milanés)
Amo esta isla, soy del Caribejamás podría pisar tierra firme,porque me inhibe.No me hablen de continenteque ya se han abarrotado,usted mira a todos lados,y lo ve lleno de gente,no es que tanto me moleste,pero pocos son de allí,se fueron de allá, de aquí,y hoy arrastran esa pena,de sentirse entre cadenas,que es lo que me pasa a mí.El que nació en el Caribe,goza de una facultad,al sentir su libertad,se identifica y la vive,al cambiar la que lo inhibe,por su mar, por su palmera,una eterna primavera,o un sol que entra en su piel,va sintiendo que no es ély pierde hasta su bandera.
Os Astros Íntimos ( Thiago de Mello)

Os astros íntimosConsulto a luz dos meus astros, cada qual de cada vez. Primeiro olho o do meu peito: um sol turvo é o meu defeito. A minha amada adormece desgostosa do que sou: a estrela da minha fronte de descuidos se apagou. Ela sonha mal do rumo que minha galáxia tomou. Não sabe que uma esmeralda se esconde na dor que dou. A cara consigo ver, sem tremor e sem temor, da treva engolindo a flor. Percorre a mata um espanto. A constelação que outrora ardente cruzava o campo da vida, hoje mal demora no fulgor de um pirilampo. Mas vale ver que perdura serena em seu resplendor, mesmo de luz esgarçada, a nebulosa do amor.Barreirinha, Ponta da Gaivota, 97
O Bicho Homem
FagnerComposição: Fagner – Francisco Carvalho
Que bicho é o homem, de onde ele veio para onde vai?De onde ele veio para onde vai?Onde é que entra, de onde é que sai?Que raio lhe acende a chama da fúriaO que é que sobra da cesta básica de sua penúriaQue bicho é o homem, do que se enfeita que mão o ampara No chão de enigmas em que se deitaQue bicho é o homem Que mama no seio da reminiscênciaE que embala a morte em seu devaneioQue bicho é esse que carrega o fardo de uma dor medonhaQue sucumbe o fardo mas ainda sonha?Que bicho vagueia na treva hediondaQue pantera esguia será mais veloz do que a própria sombra?
O homem que tece as malhas da lei, que bicho é o homem Que transforma em pêssego as fezes do rei?Que bicho é o homem que ama e desama, que afaga e magoa E que às vezes lembra um anjo em pessoa?O homem que vai para a eternidade num saco de lixoQue bicho é o homem de salário fixo?Que bicho é o homem que trapaceia, que às vezes pensaQue é mais brilhante do que a papa ceia?Que bicho é esse que escreve as vogais das cinzas do pai?De onde ele veio e para onde vai?Que bicho é o homem que se interroga léguas de volúpiaSonhos e utopias tudo se evapora Que bicho é o homem de argila e colosso que lavra e semeia?Mas só colhe insônias em lavoura alheia?Os rastros do homem no vento ou na água são rastros de feraMas que bicho é esse que se dilacera?O homem suplica, os deuses concedem, que bicho é o homem Que sempre regressa às praias do Éden?Que bicho é o homem que escreve poemas na aurora agônicaE depois acende a fogueira atômica?
Que bicho te oferta um ramo de rimasE à sombra dos mortos semeia gemidos por sete Hiroximas?Que bicho te espreita aos olhos dos becosOnde os cães insones mastigam as sombras dos antigos donos?Que bicho é o homem que rasteja e voa, que se ergue e cai?De onde ele veio e para onde vai?Que bicho é o homem, de onde ele veio e para onde vai?Onde é que entra de onde é que sai?
Baião da Garoa
FagnerComposição: Luiz Gonzaga/Hervê Cordovil
Na terra secaQuando a safra não é boaSabiá não entoaNão dá milho e feijãoNa Paraíba, Ceará, nas AlagoasRetirantes que passamVão cantando seu rojão.
Tra-lá lá lá lá lá láTra-lá lá lá lá lá lá
Meu São Pedro me ajudeMande chuva, chuva boaChuvisqueiro, chuvisquinhoNem que seja uma garoa.
Uma vez choveu na terra secaSabiá então cantouHouve lá tanta farturaQue o retirante voltou.
Oil Graças a DeusChoveu, garoou.
A DANÇA DA PSIQUE ( Augusto dos Anjos)
A dança dos encéfalos acesos /Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços/ As cabeças, as mãos, os pés e os braços /Tombam, cedendo à ação de ignotos pesos!/E então que a vaga dos instintos presos- Mãe de esterilidades e cansaços -Atira os pensamentos mais devassos /Contra os ossos cranianos indefesos/Subitamente a cerebral coréia/Pára. O cosmos sintético da Idéia/Surge. Emoções extraordinárias sinto/Arranco do meu crânio as nebulosas/E acho um feixe de forças prodigiosas/Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

ACROBATA DA DOR ( Cruz e Sousa)

Gargalha, ri, num riso de tormenta, como um palhaço, que desengonçado, nervoso, ri, num riso absurdo, inflado de uma ironia e de uma dor violenta. Da gargalhada atroz, sanguinolenta, agita os guizos, e convulsionado salta, gavroche, salta clown, varado pelo estertor dessa agonia lenta ... Pedem-se bis e um bis não se despreza! Vamos! retesa os músculos, retesa nessas macabras piruetas d'aço. . . E embora caias sobre o chão, fremente, afogado em teu sangue estuoso e quente, ri! Coração, tristíssimo palhaço.


MÚSICA DA MORTE ( Cruz e Souza)

A música da Morte, a nebulosa, estranha, imensa música sombria, passa a tremer pela minh'alma e fria gela, fica a tremer, maravilhosa ... Onda nervosa e atroz, onda nervosa, letes sinistro e torvo da agonia, recresce a lancinante sinfonia sobe, numa volúpia dolorosa ... Sobe, recresce, tumultuando e amarga, tremenda, absurda, imponderada e larga, de pavores e trevas alucina ... E alucinando e em trevas delirando, como um ópio letal, vertiginando, os meus nervos, letárgica, fascina ...
FRAGMENTOS DE UM DISCURSO AMOROSO(Roland Barthes): A necessidade desse livro se apóia na seguinte consideração: o discurso amoroso é hoje em dia de uma extrema solidão.

“Encontro pela vida milhões de corpos; desses milhões posso desejar centenas; mas dessas centenas, amo apenas um. O outro pelo qual estou apaixonado me designa e especialidade do meu desejo. Esta escolha, tão rigorosa que só retém o Único, estabelece, por assim dizer, a diferença entre a transferência analítica e a transferência amorosa; uma é universal, a outra é específica. Foram precisos muitos acasos, muitas coincidências surpreendentes (e talvez muitas procuras), para que eu encontre a Imagem que, entre mil, convém ao meu desejo. Eis o grande enigma do qual nunca terei a solução: por que desejo esse? Por que o desejo por tanto tempo, languidamente? É ele inteiro que desejo (uma silhueta, uma forma, uma aparência)? Ou apenas uma parte desse corpo? E, nesse caso, o que, nesse corpo amado, tem a tendência de fetiche em mim? Que porção, talvez incrivelmente pequena, que acidente? O corte de uma unha, um dente um pouquinho quebrado obliquamente, uma mecha, uma maneira de fumar afastando os dedos para falar? De todos esses relevos do corpo tenho vontade de dizer que são adoráveis. Adorável quer dizer: este é o meu desejo, tanto que único: “É isso! Exatamente isso (que amo)!” No entanto, quanto mais experimento a especialidade do meu desejo, menos posso nomeá-la; à precisão do alvo corresponde um estremecimento do nome; o próprio do desejo não pode produzir um impróprio do enunciado: deste fracasso da linguagem, só resta um vestígio: a palavra “adorável” (a boa tradução de “adorável” seria ipse latino: é ele, ele mesmo em pessoa)."

"Eu sofro a tua ausência te quero sonho com você para você contra você me responde teu nome é um perfume espalhado." ( geocities)
ESTE É O PRÓLOGO ( Federico Garcia Lorca)
Deixaria neste livro toda a minha alma. este livro que viu as paisagens comigo e viveu horas santas.
Que pena dos livros que nos enchem as mãos de rosas e de estrelas e lentamente passam !
Que tristeza tão funda é olhar os retábulos de dores e de penas que um coração levanta !
Ver passar os espectros de vida que se apagam, ver o homem desnudo em Pégaso sem asas,
ver a vida e a morte, a síntese do mundo, que em espaços profundos se olham e se abraçam.
Um livro de poesias é o outono morto: os versos são as folhas negras em terras brancas,
e a voz que os lê é o sopro do vento que lhes incute nos peitos - entranháveis distâncias.
O poeta é uma árvore com frutos de tristeza e com folhas murchas de chorar o que ama.
O poeta é o médium da Natureza que explica sua grandeza por meio de palavras.
O poeta compreende todo o incompreensível e as coisas que se odeiam, ele, amigas as chamas.
Sabe que as veredas são todas impossíveis, e por isso de noite vai por elas com calma.
Nos livros de versos, entre rosas de sangue, vão passando as tristes e eternas caravanas
que fizeram ao poeta quando chora nas tardes, rodeado e cingido por seus próprios fantasmas.
Poesia é amargura, mel celeste que emana de um favo invisível que as almas fabricam.
Poesia é o impossível feito possível. Harpa que tem em vez de cordas corações e chamas.
Poesia é a vida que cruzamos com ânsia, esperando o que leva sem rumo a nossa barca.
Livros doces de versos sãos os astros que passam pelo silêncio mudo para o reino do Nada, escrevendo no céu suas estrofes de prata.
Oh ! que penas tão fundas e nunca remediadas, as vozes dolorosas que os poetas cantam !
Deixaria neste livro toda a minha alma...
( tradução: William Agel de Melo )
VOLTA DE PASSEIO
Assassinado pelo céu, entre as formas que vão para a serpente e as formas que buscam o cristal, deixarei crescer meus cabelos.
Com a árvore de tocos que não canta e o menino com o branco rosto de ovo.
Com os animaizinhos de cabeça rota e a água esfarrapada dos pés secos.
Com tudo o que tem cansaço surdo-mudo e mariposa afogada no tinteiro.
Tropeçando com meu rosto diferente de cada dia. Asassinado pelo céu !
( tradução: William Agel de Melo )
Superbacana
Caetano VelosoComposição: Caetano Veloso
Toda essa gente se enganaOu então finge que não vê que eu nasciPra ser o superbacanaEu nasci pra ser o superbacana
Superbacana SuperbacanaSuperbacana Super-homemSuperflit, SupervincSuperist, Superbacana
Estilhaços sobre CopacabanaO mundo em CopacabanaTudo em Copacabana CopacabanaO mundo explode longe, muito longe
O sol responde
O tempo escondeO vento espalhaE as migalhas caem todas sobre
Copacabana me engana
Esconde o superamendoim
O espinafre, o biotônicoO comando do avião supersônicoDo parque eletrônicoDo poder atômico
Do avanço econômicoA moeda número um do Tio Patinhas não é minhaUm batalhão de cowboysBarra a entrada da legião dos super-heróis
E eu superbacanaVou sonhando até explodir coloridoNo sol, nos cinco sentidosNada no bolso ou nas mãosUm instante, maestro
Super-homem SuperflitSupervinc, SuperistSuperviva, SupershellSuperquentão
Malandro
Jorge AragãoComposição: Jorge Aragão/Jotabê
Lá Laiá, Laiá Laiá, Laiá Laiá Laiá!Laiá, Laiá, Laiá, Laiá Laiá!Eh! Laiá, Laiá, Laiá Laiá Laiá!Laiá Laiá Laiá, Laiá Laiá!...
Malandro!Eu ando querendoFalar com vocêVocê tá sabendoQue o Zeca morreuPor causa de brigasQue teve com a lei...
Malandro!Eu sei que vocêNem se liga pro fatoDe ser capoeiraMoleque mulatoPerdido no mundoMorrendo de amor...
Malandro!Sou eu que te faloEm nome daquelaQue na passarelaÉ porta estandarteE lá na favelaTem nome de flôr...
Malandro!Só peço favorDe que tenhas cuidadoAs coisas não andamTão bem pro teu ladoAssim você mataA Rosinha de dor...
Lá Laiá, Laiá Laiá, Laiá Laiá Laiá!Laiá, Laiá, Laiá, Laiá Laiá!Laiá, Laiá, Laiá Laiá Laiá!Laiá Laiá Laiá, Laiá Laiá!...
Malandro!
A Bela e a Fera
Chico BuarqueComposição: Edu Lobo - Chico Buarque
Ouve a declaração, oh belaDe um sonhador titãUm que dá nó em paralelaE almoça rolimãO homem mais forte do planetaTórax de SupermanTórax de SupermanE coração de poeta
Não brilharia a estrela, oh belaSem noite por detrásTua beleza de gazelaSob o meu corpo é maisUma centelha num gravetoQueima canaviaisQueima canaviaisQuase que eu fiz um soneto
Mais que na lua ou no cometaOu na constelaçãoO sangue impresso na gazetaTem mais inspiraçãoNo bucho do analfabetoLetras de macarrãoLetras de macarrãoFazem poema concreto
Oh bela, gera a primaveraAciona o teu condãoOh bela, faz da besta feraUm príncipe cristãoRecebe o teu poeta, oh belaAbre teu coraçãoAbre teu coraçãoOu eu arrombo a janela

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A História de Lily Braun
Chico BuarqueComposição: Edu Lobo/Chico Buarque
Como num romanceO homem de meus sonhosMe apareceu no dancingEra mais umSó que num relanceOs seus olhos me chuparamFeito um zoom
Ele me comiaCom aqueles olhosDe comer fotografiaEu disse cheeseE de close em closeFui perdendo a poseE até sorri, feliz
E voltouMe ofereceu um drinqueMe chamou de anjo azulMinha visão foi desde entãoFicando flou
Como no cinemaMe mandava às vezesUma rosa e um poemaFoco de luzEu, feito uma gemaMe desmilinguindo todaAo som do blues
Abusou do scotchDisse que meu corpoEra só dele aquela noiteEu disse pleaseXale no decoteDisparei com as facesRubras e febris
E voltouNo derradeiro showCom dez poemas e um buquêEu disse adeusJá vou com os meusNuma turnê
Como amar esposaDisse ele que agoraSó me amava como esposaNão como starMe amassou as rosasMe queimou as fotosMe beijou no altar
Nunca mais romanceNunca mais cinemaNunca mais drinque no dancingNunca mais cheeseNunca uma espeluncaUma rosa nuncaNunca mais feliz
Le Navire Negrier ( Castro Alves- Condoreirismo)

Et l'orchestre se rit ironique, strident. Et de la ronde fantastique, le serpent Fait de folles spirales... Si le vieillard halète, s'il glisse On entend des cris. . . le fouet claque Et la ronde s'affole.
Rivée aux maillons d'une seule chaine, La foule affamée titube Et pleure ef danse! L'uji délire de rage, l'aufre perd le sens, Un autre, hébété de douleur, En chantant, rit et pleure!
Por que mentias?Por que mentias leviana e bela? Se minha face pálida sentias Queimada pela febre, e minha vida Tu vias desmaiar, por que mentias? Acordei da ilusão, a sós morrendo Sinto na mocidade as agonias. Por tua causa desespero e morro... Leviana sem dó, por que mentias? Sabe Deus se te amei! Sabem as noites Essa dor que alentei, que tu nutrias! Sabe esse pobre coração que treme Que a esperança perdeu por que mentias! Vê minha palidez- a febre lenta Esse fogo das pálpebras sombrias... Pousa a mão no meu peito! Eu morro! Eu morro! Leviana sem dó, por que mentias? ( Álvares de Azevedo- 2ª fase do Romantismo no Brasil)
Alegria, Alegria
Caetano VelosoComposição: Caetano Veloso
Caminhando contra o ventoSem lenço e sem documentoNo sol de quase dezembroEu vou...
O sol se reparte em crimesEspaçonaves, guerrilhasEm cardinales bonitasEu vou...
Em caras de presidentesEm grandes beijos de amorEm dentes, pernas, bandeirasBomba e Brigitte Bardot...
O sol nas bancas de revistaMe enche de alegria e preguiçaQuem lê tanta notíciaEu vou...
Por entre fotos e nomesOs olhos cheios de coresO peito cheio de amores vãosEu vouPor que não, por que não...
Ela pensa em casamentoE eu nunca mais fui à escolaSem lenço e sem documento,Eu vou...
Eu tomo uma coca-colaEla pensa em casamentoE uma canção me consolaEu vou...
Por entre fotos e nomesSem livros e sem fuzilSem fome, sem telefoneNo coração do Brasil...
Ela nem sabe até penseiEm cantar na televisãoO sol é tão bonitoEu vou...
Sem lenço, sem documentoNada no bolso ou nas mãosEu quero seguir vivendo, amorEu vou...
Por que não, por que não...Por que não, por que não...Por que não, por que não...Por que não, por que não...
Gonçalves Dias
The song of exile — traslate Nelson Ascher —
Kennst du das Land, wo die Citronen blühen, Im dunkeln Laub die Gold-Orangen glühen? Kennst du es wohl? — Dahin, dahin! Möchtl ich... ziehn. * GoetheMy homeland has many palm-trees and the thrush-song fills its air; no bird here can sing as well as the birds sing over there.
We have fields more full of flowers and a starrier sky above, we have woods more full of life and a life more full of love. Lonely night-time meditations please me more when I am there; my homeland has many palm-trees and the thrush-song fills its air. Such delights as my land offers Are not found here nor elsewhere; lonely night-time meditations please me more when I am there; My homeland has many palm-trees and the thrush-song fills its air. Don't allow me, God, to die without getting back to where I belong, without enjoying the delights found only there, without seeing all those palm-trees, hearing thrush-songs fill the air.
Levantados Do Chão
Milton NascimentoComposição: Milton Nascimento/Chico Buarque
Como então? Desgarrados da terra?Como assim? Levantados do chão?Como embaixo dos pés uma terraComo água escorrendo da mão?
Como em sonho correr numa estrada?Deslizando no mesmo lugar?Como em sonho perder a passadaE no oco da Terra tombar?
Como então? Desgarrados da terra?Como assim? Levantados do chão?Ou na planta dos pés uma terraComo água na palma da mão?
Habitar uma lama sem fundo?Como em cama de pó se deitar?Num balanço de rede sem redeVer o mundo de pernas pro ar?
Como assim? Levitante colono?Pasto aéreo? Celeste curral?Um rebanho nas nuvens? Mas como?Boi alado? Alazão sideral?
Que esquisita lavoura! Mas como?Um arado no espaço? Será?Choverá que laranja? Que pomo?Gomo? Sumo? Granizo? Maná?
A Terceira Margem do Rio
Milton NascimentoComposição: Milton Nascimento e Caetano Veloso
Oco de pau que diz: eu sou madeira, beira Boa, dá vau, triztriz, risca certeira Meio a meio o rio ri, silencioso, sérioNosso pai não diz, diz: risca terceira Água da palavra, água calada, pura Água da palavra, água de rosa dura Proa da palavra, duro silêncio, nosso pai, Margem da palavra entre as escuras duas Margens da palavra, clareira, luz madura Rosa da palavra, puro silêncio, nosso paiMeio a meio o rio ri por entre as árvores da vida O rio riu, ri por sob a risca da canoa O rio riu, ri o que ninguém jamais olvida Ouvi, ouvi, ouvi a voz das águas Asa da palavra, asa parada agora Casa da palavra, onde o silêncio mora Brasa da palavra, a hora clara, nosso pai Hora da palavra, quando não se diz nada Fora da palavra, quando mais dentro aflora Tora da palavra, rio, pau enorme, nosso pai

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Burguesinha
Seu JorgeComposição: Seu Jorge / Gabriel Moura / Pretinho da Serrinha
Vai no cabeleireiroNo esteticistaMalha o dia inteiroPinta de artista
Saca dinheiroVai de motoristaCom seu carro esporteVai zoar na pista
Final de semanaNa casa de praiaSó gastando granaNa maior gandaia
Vai pra baladaDança bate estacaCom a sua triboAté de madrugada
Burguesinha, burguesinhaBurguesinha, burguesinhaBurguesinhaSó no filéBurguesinha, burguesinhaBurguesinha, burguesinhaBurguesinhaTem o que querBurguesinha, burguesinhaBurguesinha, burguesinhaBurguesinhaDo croissantBurguesinha, burguesinhaBurguesinha, burguesinhaBurguesinhaSuquinho de maçã
Você não entende nada
Chico Buarque
Quando eu chego em casa nada me consolaVocê está sempre aflitaLágrimas nos olhos, de cortar cebolaVocê é tão bonitaVocê traz a coca-cola eu tomoVocê bota a mesa, eu como, eu comoEu como, eu como, eu comoVocê não está entendendoQuase nada do que eu digoEu quero ir-me emboraEu quero é dar o foraE quero que você venha comigoE quero que você venha comigo
Eu me sento, eu fumo, eu como, eu não aguentoVocê está tão curtidaEu quero tocar fogo neste apartamentoVocê não acreditaTraz meu café com suita eu tomoBota a sobremesa eu como, eu comoEu como, eu como, eu comoVocê tem que saber que eu quero correr mundoCorrer perigoEu quero é ir-me emboraEu quero dar o foraE quero que você venha comigo
Brejo da Cruz
Chico BuarqueComposição: Chico Buarque
A novidadeQue tem no Brejo da CruzÉ a criançadaSe alimentar de luzAlucinadosMeninos ficando azuisE desencarnandoLá no Brejo da CruzEletrizadosCruzam os céus do BrasilNa rodoviáriaAssumem formas milUns vendem fumoTem uns que viram JesusMuito sanfoneiroCego tocando bluesUns têm saudadeE dançam maracatusUns atiram pedraOutros passeiam nusMas há milhões desses seresQue se disfarçam tão bemQue ninguém perguntaDe onde essa gente vemSão jardineirosGuardas-noturnos, casaisSão passageirosBombeiros e babásJá nem se lembramQue existe um Brejo da CruzQue eram criançasE que comiam luzSão faxineirosBalançam nas construçõesSão bilheteirasBaleiros e garçonsJá nem se lembramQue existe um Brejo da CruzQue eram criançasE que comiam luz
A Cidade Ideal (Saltimbancos-LP)
Chico BuarqueComposição: Enriquez/Bardotti/Chico Buarque
[introdução]Jumento: Àquela altura da estrada já éramos quatro amigos.Queríamos fazer um conjunto, bem.Queríamos ir juntos à cidade, muito bem.Só que, à medida que agente ía caminhando,quando começamos a falar dessa cidade, fui percebendoque os meus amigos tinham umas idéias bem esquisitassobre o que é uma cidade. Umas idéias atrapalhadas,cada ilusão. Negócio de louco...
[música]Cachorro:A cidade ideal dum cachorroTem um poste por metro quadradoNão tem carro, não corro, não morroE também nunca fico apertado
Galinha:A cidade ideal da galinhaTem as ruas cheias de minhocaA barriga fica tão quentinhaQue transforma o milho em pipoca
Crianças:Atenção porque nesta cidadeCorre-se a toda velocidadeE atenção que o negócio está pretoRestaurante assando galeto
Todos:Mas não, mas nãoO sonho é meu e eu sonho queDeve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresFossem somente crianças
Deve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresE os pintores e os vendedoresFossem somente crianças
Gata:A cidade ideal de uma gataÉ um prato de tripa fresquinhaTem sardinha num bonde de lataTem alcatra no final da linha
Jumento:Jumento é velho, velho e sabidoE por isso já está prevenidoA cidade é uma estranha senhoraQue hoje sorri e amanhã te devora
Crianças:Atenção que o jumento é sabidoÉ melhor ficar bem prevenidoE olha, gata, que a tua pelicaVai virar uma bela cuíca
Todos:Mas não, mas nãoO sonho é meu e eu sonho queDeve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresFossem somente crianças
Deve ter alamedas verdesA cidade dos meus amoresE, quem dera, os moradoresE o prefeito e os varredoresE os pintores e os vendedoresAs senhoras e os senhoresE os guardas e os inspetoresFossem somente crianças

domingo, 20 de setembro de 2009

Colagem



Biblioteca de Areiapor Abel Barros Baptista

Quem se ocupa de livros depara de vez em quando com a distinção entre os escritores que são “homens do livro” e os escritores que são “homens da vida”; e ler, em casa, o livro de um reputado “homem da vida”, que não perdeu cor nem vigor em bibliotecas, antes matou touros ou naufragou no Pacífico, é por certo uma experiência de sobressalto. Não assim com Borges, que não concede hesitação na escolha: será seguramente um “homem do livro”, se não for o respectivo paradigma contemporâneo; e será seguramente o “homem do livro” que, muito admirando Wells, lhe lê os primeiros homens na Lua não tendo para nos dizer muito mais do que as razões da sua superioridade sobre Júlio Verne, do mesmo passo que nos convida ao confronto com Cyrano, Francis Bacon ou Luciano de Samósata. Dir-se-ia que, graças a uma página escrita, a página de um ensaio, vivemos o que fazemos, que é lê-lo, em perfeita homogeneidade com o que ele, Borges, faz, que é ler outros. Nem touros nem naufrágios (o que não elimina necessariamente o sobressalto): como se o único e mútuo propósito fosse encontrar novos livros para ler ou aprender a ler melhor aqueles que já encontrámos.
E, diga-se o que se disser, não há outra razão para ler ensaios, como não há outra razão para escrevê-los. Os ensaios de Borges são propriamente peças de biblioteca: ao mais insensível, há-de por força impressionar a quantidade de livros que aquele homem leu ou simplesmente folheou. Claro que a figura do ensaísta como bibliotecário que escreve ou escritor que faz um uso competente e ostensivo da sua biblioteca não é bem um traço específico do ensaio de Borges, mas até uma trivialidade. O jovem Lukács, por exemplo, tentando esclarecer a natureza e a forma do ensaio, fazia notar que o ensaio trata sempre de qualquer coisa a que já foi dada forma, nunca cria a partir de matéria informe: e por isso, porque apenas dá nova ordem ao que já tem forma, lhe fica submetido. Adorno, com idêntico propósito, observava por sua vez que os esforços do ensaio reflectem uma espécie de ociosidade de alguém que, meio infantilmente, não tem quaisquer escrúpulos em inspirar-se naquilo que outros fizeram antes. E não terá dito Montaigne que nunca leu um autor para formar uma opinião, senão para encontrar no livro alheio a sua própria opinião já formada há muito?
A arte do ensaio é assim, numa larga medida, uma arte da citação: não da autoridade venerada e que por isso obriga, mas da forma encontrada e que por isso se impõe. Porém, contrariamente a Montaigne, há quem pretenda que o excesso de citações denuncia sempre a falta de ideias próprias. Puro preconceito, evidentemente, que vai animando aqueles que não têm de próprio sequer a ilusão da propriedade das ideias, e a cujos olhos os sinais da frequentação deambulatória da biblioteca passam por pedantismo e parasitagem. Já os ensaios de Borges, que serenamente cultivam um certo diletantismo a matizar uma enorme erudição, estão repletos de citações. “A Esfera de Pascal”, de Novas Inquirições, em menos de três páginas cita mais de trinta autores. É apenas um exemplo de uma das suas características manifestas: a cada passo o leitor topa com expressões como “Coleridge observa que...”, ou “Bertrand Russel conclui”, ou “segundo Bloy”. A outra característica manifesta será a prática de aproximações entre os autores citados (“Epicteto [...] e Schopenhauer [...] reabilitaram com grande abundância de páginas o suicídio”), e muitas vezes, além de desconcertantes, são a própria razão de ser do ensaio, a ponto de alguns deles quase se resumirem à exposição das diversas “entoações” de uma ideia, de um tema ou de uma metáfora, à busca de fontes ou à enumeração de precursores. Mas cada uma destas características, em si mesma, se chega a fazer de Borges um mestre do ensaio breve, não acaba de lhe definir a idiossincrasia: diremos que esta se encontra na perfeita adequação entre as características distintivas do ensaio e uma noção de literatura.
Conhece-se aliás essa noção: é a noção da literatura como biblioteca. Dela já se tem imprimido, porém, uma versão vulgarizada e enganadora: não se trata, para Borges, de dizer que tudo já foi dito e por isso nada de novo se pode dizer, mas de dizer que todo o dizer é repetição (incluindo, claro, o dizer que diz isso mesmo). A diferença é notável: a versão vulgar ainda está presa da pretensão à originalidade, ou seja, supõe um tempo em que as coisas foram ditas pela primeira vez. Ora, a biblioteca de Borges é, como o famoso livro de uma das suas ficções, uma biblioteca de areia: nenhum livro é o primeiro, e nenhum livro é o último. Se o espaço da biblioteca se pode percorrer com total desprezo da linha recta, ignorando a cronologia, sem receio do anacronismo nem medo das aproximações fortuitas ou caprichosas, é porque nela a literatura se apresenta como um espaço homogéneo e reversível, obra de um único autor intemporal e anónimo. Borges cita Valéry (a história da literatura entendida como história do espírito produtor e consumidor de literatura poderia ser levada a cabo sem mencionar um único escritor), cita Emerson (todos os livros do mundo parecem obra de um único cavalheiro omnisciente), cita Shelley (todos os poemas do passado, do presente e do futuro são episódios ou fragmentos de um único poema infinito). E formula a condição: “Se for válida a doutrina de que todos os autores são um autor...”, referindo-se a Angelus Silesius...!
Como pode a abundância de autores citados conformar-se com a concepção de que todos os autores são um autor? Simplesmente através da figura do único autor intemporal e anónimo como metáfora da literatura. Num certo sentido, Borges é um ensaísta de “mentalidade clássica”, para quem “o essencial é a literatura, não os indivíduos”; mas, por outro lado, a biblioteca como espaço homogéno e reversível justamente destrói a autoridade do clássico e a consequente subjugação dos vindouros: uns e outros são igualmente nossos contemporâneos, os do presente modificam a nossa concepção do passado, tal como hão-de afectar o futuro. Neste outro sentido, Borges é um ensaísta moderno, para quem o “essencial” não se capta num modelo situado num ponto qualquer do passado, ou na originalidade fundadora de um primeiro dizer, mas na própria repetição e na incessante indagação das entoações, das modulações, das diferenças que nela se insinuam.
Assim, conjugando citação e aproximação, o ensaio de Borges deixa-nos duas lições críticas. A primeira repudia a noção de livro definido essencialmente pelo autor de quem seria a expressão. Borges elege os seus autores, tem a sua biblioteca pessoal, como se sabe, mas cultiva-os nos termos que deixou explícitos no elogio de Valéry: “um homem que transcende os aspectos diferenciais do eu e de quem podemos dizer, como William Hazlitt de Shakespeare: ‘He is nothing in himself’”. Ou ainda, usando outra das suas fórmulas, elege-os como autores que são “menos literatos do que uma literatura”. A outra lição é de alerta: contra o perigo que espreita quem divaga pela biblioteca: o da tentação de encontrar toda a literatura num único autor. “Durante muitos anos eu mesmo acreditei que a quase infinita literatura se encontrava num homem. Esse homem foi Carlyle, foi Johannes Becher, foi Whitman, foi Rafael Cansinos-Asséns, foi Thomas de Quincey.”


Publicado pela primeira vez no Expresso, edição de 28 de Novembro de1998. Depois recolhido no livro Coligação de Avulsos. Ensaios de Crítica Literária, Lisboa, Cotovia, 2003, pp. 85-90.
Retrato Quase Apagado em que se Pode Ver Perfeitamente Nada - "O Guardador de Águas" (MANOEL DE BARROS)

Não tenho bens de acontecimentos.O que não sei fazer desconto nas palavras.Entesouro frases. Por exemplo:- Imagens são palavras que nos faltaram.- Poesia é a ocupação da palavra pela Imagem.- Poesia é a ocupação da Imagem pelo Ser.Ai frases de pensar!Pensar é uma pedreira. Estou sendo.Me acho em petição de lata (frase encontrada no lixo)Concluindo: há pessoas que se compõem de atos, ruídos, retratos.Outras de palavras.Poetas e tontos se compõem com palavras.IITodos os caminhos - nenhum caminhoMuitos caminhos - nenhum caminhoNenhum caminho - a maldição dos poetas.IIIChove torto no vão das árvores.Chove nos pássaros e nas pedras.O rio ficou de pé e me olha pelos vidros.Alcanço com as mãos o cheiro dos telhados.Crianças fugindo das águasSe esconderam na casa.Baratas passeiam nas formas de bolo...A casa tem um dono em letras.Agora ele está pensando -no silêncio Iíquidocom que as águas escurecem as pedras...Um tordo avisou que é março.IVAlfama é uma palavra escura e de olhos baixos.Ela pode ser o germe de uma apagada existência.Só trolhas e andarilhos poderão achá-la.Palavras têm espessuras várias: vou-lhes ao nu, aofóssil, ao ouro que trazem da boca do chão.Andei nas pedras negras de Alfama.Errante e preso por uma fonte recôndita.Sob aqueles sobrados sujos vi os arcanos com flor!VEscrever nem uma coisa Nem outra -A fim de dizer todasOu, pelo menos, nenhumas.Assim,Ao poeta faz bemDesexplicar -Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes.VINo que o homem se torne coisal,corrompem-se nele os veios comuns do entendimento.Um subtexto se aloja.Instala-se uma agramaticalidade quase insana, que empoema o sentido das palavras.Aflora uma linguagem de defloramentos, um inauguramento de falasCoisa tão velha como andar a péEsses vareios do dizer.VIIO sentido normal das palavras não faz bem ao poema.Há que se dar um gosto incasto aos termos.Haver com eles um relacionamento voluptuoso.Talvez corrompê-los até a quimera.Escurecer as relações entre os termos em vez de aclará-los.Não existir mais rei nem regências.Uma certa luxúria com a liberdade convém.VIINas Metamorfoses, em 240 fábulas,Ovídio mostra seres humanos transformados em pedras vegetais bichos coisasUm novo estágio seria que os entes já transformadosfalassem um dialeto coisal, larval,pedral, etc.Nasceria uma linguagem madruguenta, adâmica, edênica, inaugural
- Que os poetas aprenderiam -desde que voltassem às crianças que foramàs rãs que foramàs pedras que foram.Para voltar à infância, os poetas precisariam também de reaprender a errara língua.Mas esse é um convite à ignorância? A enfiar o idioma nos mosquitos?Seria uma demência peregrina.IXEu sou o medo da lucidezChoveu na palavra onde eu estava.Eu via a natureza como quem a veste.Eu me fechava com espumas.Formigas vesúvias dormiam por baixo de trampas.Peguei umas idéias com as mãos - como a peixes.Nem era muito que eu me arrumasse por versos.Aquele arame do horizonteQue separava o morro do céu estava rubro.Um rengo estacionou entre duas frases.Uma descorQuase uma ilação do branco.Tinha um palor atormentado a hora.O pato dejetava liquidamente ali.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O bêbado

Um corpo cambaleia na madrugada fria. Os passos ritmados no dois pra cá, dois pra lá como se dançasse o bolero de Havel. Pende-lhe das mãos flácidas e embrutecidas uma garrafa de bebida ordinária. Da camisa rota e amarrotada salta o ventre volumoso. Pescoço e rosto tingem-se de rubro.
A boca vacilante tenta, em vão, uma canção melancólica, enquanto os vagos olhos buscam o caminho certo.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Uma entrada nas selvas

Até ali a caminhada tinha sido agradável. Mas, agora,defronto-me com meu medo: penetrar na selva desconhecida.
Toda a luminosidade aos poucos cede lugar à escuridão úmida e sufocante.
Três andares de árvores, superpondo-se poderosos, abrigam sons agudos e indefinidos. O macaco assustado pula para um galho mais alto. Uma ave de rapina, imóvel, no último andar, parece procurar alimento. Desce o tronco gigantesco uma serpente, aprontando-se para dar o golpe certeiro num animal distraído...
Os cipós tecem entre as árvores caminhos sem volta. O solo é um tapete de folhas mortas e úmidas, onde minúsculos animais disputam as sobras fétidas.
A Natureza impõe-se, comandando a vida e a morte, ameaçando cada passo, cada movimento.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

ANJO TORTO ( Chico Buarque de Hollanda)

"Quando nasci veio um anjo safado
Um chato de um querubim
que decretou que estava predestinado
a ser errado assim
já de saída minha estrada entortou,
mas vou até o fim

Por causa de umas questões paralelas
deu praga no meu capim
não sou ladrão, não sou mais bom de bola
e a minha voz chinfrim
mamãe brigou com o dono da venda
mas vou até o fim (...)"

terça-feira, 8 de setembro de 2009

TIRO AO ÁLVARO ( Adoniran Barbosa)

"De tanto levá/frexada du seu oiá/ Meu peito até parece mais o que?/ Bala de tiro ao álvaro/ não tem mais ondi frexá.
Teu olhar mata mais do que bala de carabina/ veneno estriquinina/ peixeira de baiano.
Teu olhar mata mais que atropelamento/mata mais que arrombamento/ que bala de revólver."

terça-feira, 1 de setembro de 2009

VOZ

Onde está essa voz,
Dessas bocas mudas.
Que gemem e que grunhem
Por debaixo do pano

Onde está o brilho
Dos olhares distantes
De todos os amantes
Que se perdem num engano.

Só querem ganhar,
Subir mais um posto.
Uma cara sem rosto,
Sem forças pra mudar.